A senhora do primeiro direito deu um arranjo no cabelo, envergou o robe amarelo de trazer por casa, encostou-se ao corrimão da varanda pondo o cotovelo no queixo, ajeitou os óculos no nariz adunco, e continuou a observação do dia anterior à mesma hora das dez da manhã.E vendo o marido na rua :
- Ó Eleutério, encontrastes os carapaus?
- Siiim,siiim - uns sins displicentes, carregados de resignação.
- Atão porque não trazes já p'ra casa o pêxe ?
- Vou jáaaa, mulher - com um encolher de ombros,levantando as sobrancelhas e olhando para o amigo com quem continuou a conversar.
Mas ela não desarmava :
- Olha lá, Elutério traz-me tambem duas caxas de fósforos, tás a ouvilr?
- Siiim, Odete - o peso dos 32 anos de casamento arrastando a resposta.
E o amigo Salvador:
- Olha eu também tenho de passar pela venda, vou contigo.
E Odete levantando mais a voz :
- Ó homem na te vás embora traz-me primero os carapaus !
- Mas atão queres os fósforos ou queres os besugues ?
- Cais besugues ? - as palavras dela caindo como um raio, da varanda.
- Ná havia carapaus, só besugues,Odete - e os besugues e os carapaus saindo da garganta
do Elutério e subindo a custo até à varanda.
- Tá bem, vai lá buscar os fósforos.
- Ó Salvador tás a ver com'e ela é , ora quer iste, ora quer aquilo !
- Quéque tás prá'i dezendo, vê lá se t'avias, anda pr'a cima !
- Já agora, Odete, vou comprar os fósforos...
E o Eleutério começou a descer a rua com o amigo.
Mas a Odete não se deu por vencida :
- Ó Salvador, dexa ai os besugues na porta q'eu vou-me lá abaxo .
Mas os amigos já se afastavam depressa.
E a Odete, chegando à porta:
- Naquerem lá ver, raisparta o homem, nem carapaus, nem fósforos, nem besugues, más ca grande sina a minha !
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