"Eu que só gosto de vestidos velhos,
de velhas casas com paredes tortas,
de poeiras ancestrais, de cinzas mortas,
de desbotados rosas e vermelhos;
eu que só gosto de velhos quintais
com ásperas roseiras mal regadas
de cortinas de rendas passajadas
por velhos dedos com velhos dedais;
eu que só gosto de velhas gavetas,
de velhas malas com cetins puídos,
sedas, fitas, perfumes esquecidos,
leques, missais, raminhos de violetas;
eu que só quero o que ninguém cobiça,
oiros de sol e pratas de nevoeiros,
filigranas de flores nos canteiros,
folhas soltas que o vento desperdiça,
espuma de marés, conchas vazias,
cintilações de estrelas, céus distantes,
gotas de orvalho - frescos diamantes,
canções de búzios --verdes melodias;
eu que só peço a Deus o que sobeja
de humanas ambições e vãs partilhas,
continentes de luar, sonhadas ilhas,
nuvens de fumo que ninguém deseja;
eu que só quero a rude sinfonia
do vento à solta e os dedos de veludo
da chuva nos beirais da minha rua,
aroma, essência, pólen, harmonia,
eu, que não quero nada, quero tudo:
quero a Poesia."
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