Eu e o Nunes, quartanistas de Agronomia por vezes abancávamo-nos a lanchar naquela pastelaria junto à estação dos eléctricos de Santo Amaro. Uma pastelaria do modelo clássico dos bairros lisboetas nos anos quarenta do século passado: bancos altos junto à bancada, garrafas de bebidas variadas, em prateleiras de vidro atrás do empregado que nos servia.
- Que desejam?
Pedimos o mesmo:
- Olhe, queremos os dois, um copo de leite e um bolo de arroz para cada um - disse-lhe eu.
O empregado pegou num copo e no depósito dos líquidos deitou em cada copo metade de leite e metade de água, depositou um bôlo de arroz em cada prato e serviu-nos.
Observáramos a vigarice e, quando o empregado se afastou, disse ao Nunes:
- Vais ver o que faço depois
Terminado o lanche chamei o empregado:
- Faz favor, quanto lhe devemos?
- Dois escudos, cada um! - disse ele, indiferente.
Naquele tempo o copo de leite tinha valor tabelado de um escudo e vinte centavos e um bolo de arroz custava oitenta centavos.
O Nunes pagou os dois escudos
Eu pedi ao empregado um copo de água. Quando este o trouxe, peguei no pires onde havia estado o bolo de arroz, deitei-lhe água e pus no pires um escudo e trinta centavos, a nadar dentro da água.
- Que é isto? - disse o empregado meio zangado, ameaçador.
- Ora, isso é o que custa um bolo de arroz, meio copo de leite mais meio de de água...
O empregado ouviu-me e disse:
- Olhe que eu chamo a polícia!
Não me perturbei e respondi-lhe, segurando no pires com a água e o dinheiro:
Chame, chame, que nós mostramos-lhe isto!
E a conversa ficou por ali, sem a polícia.
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