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segunda-feira, 9 de maio de 2016

Sem umbigo

Não me agradou ver o meu umbigo num plano horizontal, não sei porque comecei a pensar nisso. Pensar é uma forma de olhar para dentro, eu não concebo olhar para dentro do umbigo, não recordo a primeira imagem que vi, gostaria de a recordar, é provável que apenas visse uma mancha ou apenas visse luz, essa primeira impressão que atravessou os meus nervos ópticos e que atingiu o cérebro e fez parte de tudo o que ajudou a despertar a minha mente que antes sentia sons, sentia música, sentia vozes, cantos e talvez alguma palavra mais agreste. Contaram-me a história dum homem a quem lhe cortaram o umbigo rente à barriga, quando nasceu, cosendo-o depois e deixando uma cicatriz que se foi esfumando, sendo quase indelével depois dos seus cinco anos de idade. Os amigos, quando o viam na praia, brincavam com ele, diziam-lhe que era peixe, as namoradas ficavam excitadíssimas quando passavam a mão sobre o lugar onde deveria estar o umbigo, um médico felicitou-o por ainda estar vivo, outro recomendou-lhe uma dieta, tinha de receitar qualquer coisa, outro ainda disse-lhe que não pensasse em bruxas ou maus olhados, outro ainda, o mais sensato de todos, disse-lhe que não tinha nada mas que gostaria de o observar todos os anos, nada levaria pelas consultas. E a última namorada por fim conseguiu casar com ele e o que é verdade é que de tanto se excitar por ver a barriga do marido sem umbigo teve catorze filhos, todos com umbigos, cortados e metidos para dentro nas devidas condições.

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