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quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Encontro com um solitário

Fernando parou o "jeep" um pouco fora da picada. Uma pequena ravina e a uns quarenta metros uma linha de água seca, entusiasmou-o, encontrara o que necessitava para o projeto. Desceu um pouco e estacou surpreso. Uma restolhada forte lá para diante, do outro lado da ribeira seca, alertou-o. Estava na reserva de caça, a uns dez quilómetros do acampamento e da sua casa, na povoação. Pensou nas histórias de leões, de famílias de leões famintos, não tinha uma espingarda de caça grossa para se defender dum ataque súbito. Principalmente se no grupo de felinos houvesse crias. Mas aquela mata diante dos seus olhos não era mata de leão, não era a característica anhara de espinheiras, pelo contrário abundavam maciços de hiparrenias e erva abundante. A restolhada cessara, Fernando com a arma, uma vinte e dois longo, a tiracolo, começou a prospeção da linha de água, acompanhado pelo ajudante moreno.
        - Moisés, ouviste?
        - Ouvi patrão, aquilo deve ser burros do mato, gazelas ou búfalos não haver neste mato.
        - Então vamos para baixo, quando chove, lá para baixo deve levar muita água, que achas?
        - Deve patrão, mas patrão eu não ir, eu ficar no "jeep" ...
        - Bem espera lá, no carro. Não me demoro.


Seguiu pela mulola, inspecionando as margens, sempre atento, com a arma pronta a disparar. O administrador da empresa tinha-lhe recomendado: descubra-me uma boa ribeira, onde possa construir uma pequena barragem com uma albufeira que nos permita agua suficiente no cacimbo para plantarmos uma horta e termos hortaliças frescas, pouco abundantes no local.
Mais duas ou três sinuosidades da linha de água, fizera talvez uns dois quilómetros. E ao entrar numa área bastante plana, as margens afastadas umas centenas de metros, de súbito estacou, fitou com preocupação um vulto grande que emergia da vegetação densa da planície. Apenas via a cabeça enorme do elefante, uns trinta metros à sua frente, as gramíneas hiparreneas tapando-lhe o corpo. Felizmente o vento contra batia-lhe na cara e o animal, um solitário de dentes bem grandes e recurvados,, não se apercebeu da presença de Fernando.


Só tinha que recuar em silêncio e orar para que o elefante não notasse a sua presença. Os elefantes, em manada, são animais calmos, pouco agressivos, se alguém se aproxima a pé, não ataca, quando muito agita as orelhas e, erguida a tromba, avança uns passos, as orelhas agitando, ameaçador. E por aí fica se as visitas não insistem.  Porém um elefante solitário, excluído da manada pela idade ou por incapacidade física perante os mais novos, é sempre um animal perigoso, quase sempre ataca quem se aproxima assim que o divisa.


Pelo que, de seguida e lentamente, Fernando  iniciou o regresso, sempre atento. Apesar do vento favorável,  procurando não provocar qualquer ruido, seria um suicídio avançar pela planície, com uma arma que apenas faria cócegas ao animal. Os elefantes têm visão deficiente mas são, no mato, os animais de ouvido mais apurado.


Chegou ao local onde esperava encontrar o "jeep" e o Moisés mas nada. Nem "jeep" nem Moisés.
A noite não tardaria a chegar, não podia arriscar-se a regressar de noite. E voltou a pé, encontrando a família preocupadíssima. E o "jeep" á porta, o Moisés falando logo que o viu:
          - Patrão pensei que se tivesse perdido, vim logo na casa...
          - Moisés, devias ter esperado mais !
          - Patrão ouvi mais barulho no mato, aquilo era leão, era leão..
      Abri a porta do "jeep" para tirar de lá a pasta que levara. O cheirete lá dentro era intenso.
      Coitado, do Moisés, não resistindo ao medo, borrara-se  todo...
         

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