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quinta-feira, 2 de março de 2017

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Todos os parentes que frequentavam a casa da avó Josefa gostavam da Maria da Conceição, a cozinheira que todos carinhosamente tratavam por Chachão. Célebre pelo seu famoso arroz de pato, sempre gabado pelos participantes dos almoços de família após os quais era exigida a sua presença na sala de jantar para ouvir, modesta, recatada e serena os encómios não raro acompanhados de aplausos, pelo prato de arroz servido.
Na hi stória antiga da família daqueles avós, constavam, mergulhada profundamente no mistério das recordações caseiras, os assédios sexuais do falecido bisavô Bernardo Paz, homem alto, louro, de porte atlético, impetuoso e sem contemplações, nos costumes viciados por tradição indecorosa de muitas pretensas famílias de bem, desses tempos. As criadas de servir - assim se chamavam então as empregadas domésticas - não raro acumulavam o serviço de limpeza ou de cozinheira com o serviço do seu corpo na cama do dono da casa ou na de algum dos seus filhos. O que por vezes resultava em consequências visíveis na barriga das ofendidas ocultadas nos tempos seguintes, de forma variada - aborto conseguido por meio de suborno pecuniário suficiente para contentar os pais enfurecidos ou do filho resultante, afastado e mantido em permanência dourada e encaminhado no futuro em bom emprego, sempre desconhecendo a sua origem paterna. A ameaça proveniente da diferença de classes impedia qualquer tentativa de esclarecimento da verdade e os costumes quase tradições, da submissão animal aos donos das casas, levavam a que o assédio sexual fosse considerado um direito do macho patrão.
      

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