XXXIX
Aquêle Agôsto decorria quente e húmido, convidando a descanso, a férias. Mas raros foram os colaboradores a solicitá-las, porque só Mariana, a primeira administrativa e João Pedro, o primeiro distribuidor, tinham direito a férias. Porém, as tarefas eram tantas, tão absorventes, gerando tanto entusiasmo e agrado que poucos pensaram nas férias. Júlia, após o baptizado, no regresso a casa com o marido e os filhos, lembrou:
- Fernando, reparaste que poucos pediram uns dias de férias, nem os primeiros que colaboraram connosco, a Mariana e o João Pedro?
. - Olha Júlia, apesar dêste calor nem eu me tinha lembrado - e os filhos, não deixando os pais prosseguir:
- Mãe, já tínhamos perguntado ao pai onde vamos passar as férias - disse o António.
- Eu também tinha perguntado â mãe o mesmo - asseverou o Francisco.
- Bem, estamos chegando a casa, são quase horas de jantar, nem disse à Lúcia o que queríamos dentro das panelas à nossa espera. Que preferem os meninos, falamos das férias ou jantamos primeiro?
- Quem vota pelo jantar levanta um braço - acrescentou Fernando.
- Parece que empatámos. Falaremos das férias enquanto jantamos.
Seguindo a tradição o jantar resumia-se quase sempre a uma sopa rica de vegetais, pobre em gorduras e uma sobremesa de doce de frutas. Mas a Lúcia tinha caprichado e, conhecendo as preferências dos rapazes, apresentou um belo empadão, bem tostado no fôrno, desculpando-se:
- Como eu sei que a Caarolina deve estar cheia de fome e é muito exigente no leite da mamã, lembrei-me que a senhora precisava dum bom alinento. - Júlia não a deixou continuar, sabia que a Lúcia tinha sempre a corda bem desenferrujada.
- Meninos agradeçam à Lúcia êstes cuidados, E vamos então ao assunto das férias, que dizes Fernando?
- Primeiro quero dizer que só hoje, Júlia, depois que nos falaste das férias, só hoje reparei, com imenso contentamento que poucos dos nossos colaboradores se referiu às férias.
- Mas pai, ficas contente por êles não quererem férias?
- António, estavas entretido com o empadão, não onviste o que eu disse. Claro que para nós todos na fundação, as férias ou antes, a pausa de alguns dias na colaboração e na actividade, é importante. O que nos agradou foi verificar que ninguém na FAP parece ter perdido o entusiasmo e o interêsse pela sua ocupação. E se essa atitude se mantiver, melhor ainda nos sentiremos. No entanto acho que todos deverão gozar os seus dias de férias.
Foi a vez do Francisco contribuir para a conversa:
- Pai, nós temos várias férias por ano.
- Claro, as férias constituiem um direito de quem trabalha e, no vosso caso, dos estudos. Os colaboradors da FAP têem igual direito. No entanto, o que pretendemos na FAP é que todos os nossos companheiros pensem no que fazem lá como uma ocupação, uma actividade destituida dos anátemas, das penas atribuidas ao trabalho. Ainda hoje, é ou não verdade que quando se fala em trabalho, muita gente associa-o à ideia dum sacrifício? Por isso o ideal será que as férias, para todos, sejam encaradas como um descanso, uma pausa nessa ocupação. Que o trabalho seja escolhido por cada um no que mais goste de se aplicar, de fazer, de se ocupar. Da mesma forma quando vocês gostam e se interessam pelo que estão estudando fixam tudo com maior facilidade, é ou não verdade?
- Mas pai - disse o Francisco - falaste de pausas, eu só aprendi pausas na música!
- Tens razão. Na música, pausa é uma suspensão breve, um intervalo de silêncio, entre duas notas. Mas pausa também significa intervalo e as férias mais não são que um intervalo entre dois períodos de ocupação ou de trabalho, Francisco, tu e o teu irmão não estão estudando nas férias. Estão numa pausa ente as vossas ocupações escolares e têem-na para vós próprios, para vosso benefício. Enquanto que o trabalho, faz-se quase sempre para benefício doutros. Desde is gregos, dos egípcios, da idade média e até ao presente. O futuro trará com certeza grandes diferenças, espero que no futuro, o trabalho, aquilo a que hoje em geral se chama trabalho, venha a ser uma obsolescência.
- Pai, o que é uma obsolescência?
- É o conceito de tudo o que é obsoleto, antiquado, inusitado.
(continua)
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