Fernando, poucos momentos depois, quando a cauteleiro desaparecia do café, interrogou Carlo:
- Nunca tinha visto por aqui este cauteleiro, tu conhecias este?
- Fernando, sabes que eu nunca compro jôgo.E também não me lembro que o faças, ainda por cima um bilhete inteiro! Julgo que nunca vi este homem vendendo cautelas, Enfim, volta cá ao sonho...
Fernando, sem hesitar, respondeu-lhe:
- Vais-te rir, acredita, tudo começou na noite passada...Com um sonho de que recordo muitos pormenores, o que é raro acontecer-me depois de acordar.
- Um sonho...-disse Carlos com ar irónico e ambíguo.
- Sim, simplesmente um sonho. Apareceu-me um sujeito de ar muito bondoso, cara simpática, voz insinuante. Sem qualquer preâmbulo anunciou-me:"vais entrar num jògo que será também uma tarefa, vais ganhar agora vinte mil contos e depois muito mais. Mas com uma condição: só poderás gastar o que ganhaste em ofertas ou investimentos destinados ao benefício de pessoas carenciadas, mantendo quanto possivel o anonimato. Poderás gastá-lo nas despesas necessárias para a partilha, mas nunca como contributo para as tuas posses ou para as da tua família" - e acrescentou, a finalizar - "se não cumprires esta regra não há prémios, perderás os prémios recebidos e guardados, e desaparecerão todos os efeitos do que fizeste".
- Não nos grama o homem...Que tortura... - replicou Carlos, sorrindo.
- Escuta, deixa-me continuar. Não sei se notaste o meu espanto quando vi o cauteleiro, aquele que me vendeu este bilhete. É que ao vê-lo, a cara dele parecidíssima com acara do homem do sonho!...Fiquei como que hipnotizado, "com uma branca" como agora se diz. E quando dei por mim, estava a pagar o bilhete...Tentei que o cauteleiro me desvendasse mais alguns pormenores mas, nesse momento, ele safou-se. Passei todo o dia cheio de interesse e curiosidade pelo sucedido, tentando descobrir, vislumbrar, o significado do sonho. Duvidava e pensava que não se trataria mais do que uma coincidência e não de uma mensagem camuflada ou presságio interessante. Que aquele sonho nada traduzia, que seria um mistério oculto numa metáfora insondável, nada mais representando que uma aspiraçãao, desejo ou ambição secreta. Após percorrer dezenas de páginas de um dicionário de sonhos e de alguns tratados de psicologia, lido dezenas de "blogs" dedicados a sonhos, acabei esperançado que a realidade, num futuro próximo, talvez me contemplasse com uma surpresa agradável. Ou que o tempo, o que quase sempre acontece com as fantasias, se encarregasse de me fazer esquecer tudo isso.
- Bem, amanhã anda a roda, verás o resultado. Lá no fundo, parece-me que gostarias de acreditar no sonho. Que tal consultares uma bruxa? Vamo-nos embora!
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